A Receita Federal manteve seu entendimento sobre a incidência de tributos em contratos de compartilhamento de custos (cost sharing) entre empresas de um mesmo grupo econômico. A confirmação foi publicada na Solução de Consulta Cosit nº 39/2024, mesmo após a entrada em vigor da Lei nº 14.596/2023, que trata das novas regras de preços de transferência.
Na prática, a Receita continua exigindo a cobrança de IRRF (15%), Cide (10%) e PIS/Cofins-Importação (9,25%) nas remessas feitas a título de reembolso por serviços compartilhados entre empresas, especialmente quando a centralizadora está no exterior.
O compartilhamento de custos é uma prática comum em multinacionais. Nele, a matriz concentra atividades como contabilidade, tecnologia da informação (TI), jurídico e recursos humanos (RH), e repassa uma parte proporcional dos custos às filiais, com base em critérios como número de funcionários ou equipamentos.
Nova lei não altera posição da Receita
A Lei dos Preços de Transferência, sancionada em 2023, passou a reconhecer figuras como os contratos de “cost sharing” e serviços intercompany de baixo valor agregado. Com isso, muitos contribuintes esperavam uma mudança no entendimento da Receita quanto à natureza dessas operações.
Porém, na Solução de Consulta nº 39, a Receita deixou claro que não aplicará as previsões da nova lei ao caso analisado, pois o contribuinte não suscitou esse ponto expressamente. Assim, permanece válido o entendimento anterior, com a manutenção da tributação.
Para advogados tributaristas, a posição da Receita não reflete a realidade econômica das operações. O argumento é que não há prestação de serviços com lucro, mas sim mero rateio de despesas, sem acréscimo patrimonial para quem recebe os valores.
Jurisprudência ainda é favorável aos contribuintes
Apesar da posição da Receita, decisões administrativas e judiciais têm beneficiado os contribuintes. O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) e tribunais federais já reconheceram que a incidência dos tributos depende da análise do caso concreto, e há decisões contrárias à cobrança.
Por exemplo:
- O Carf, em 2020, confirmou a incidência de IRRF com base na SC nº 43/2015;
- O TRF-4 reconheceu, em julgamentos diferentes, a incidência de Cide e PIS/Cofins-Importação;
- O TRF-2, em 2021, também considerou devida a Cide, mesmo sem lucro envolvido, por entender que o fato gerador é a remuneração.
A advogada Alessandra Brandão chama atenção para um ponto importante: em casos em que o país de destino tenha tratado para evitar dupla tributação com o Brasil, como a França, é possível compensar o IRRF no exterior. No entanto, essa compensação não se aplica à Cide nem ao PIS/Cofins-Importação.
A manutenção da posição da Receita traz certa estabilidade, mas também reforça a necessidade de planejamento tributário e cautela nas operações intercompany. Especialistas recomendam atenção à natureza jurídica dos contratos de cost sharing e, quando possível, o uso de tratados internacionais para minimizar o impacto fiscal.
Contadores e tributaristas devem orientar seus clientes sobre os riscos de autuação, especialmente quando houver remessas internacionais, e avaliar alternativas jurídicas para contestar a tributação, se for o caso.
Com informações do Valor Econômico