Dedução de materiais na base do ISSQN: entenda a nova orientação do STJ

Durante anos, muitos municípios adotaram a prática de permitir a dedução de materiais da base de cálculo do ISSQN nos contratos de construção civil, especialmente quando esses materiais eram adquiridos com ICMS destacado. Em artigo anterior publicado no Portal Contábeis, intitulado “ICMS e a dedução da base de cálculo do ISSQN: quando é possível?”, analisamos esse entendimento sob a ótica da jurisprudência vigente à época.

No entanto, com a consolidação da jurisprudência pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) — especialmente no julgamento do AgInt no AREsp 2.486.358/SP (2024) — e a publicação da Nota Técnica CTAT nº 02/2025 pela CNM, faz-se necessária a atualização daquela análise, à luz da nova orientação legal e dos impactos na gestão tributária municipal.

Neste artigo, explicamos o que mudou, quais são os fundamentos legais atuais e como os municípios devem se adequar para evitar perda de arrecadação e responsabilização por renúncia de receita.

O que valia antes? (Prática anterior)

Com base em decisões isoladas do STF (como o RE 603.947/MG, em 2010), muitos tribunais e municípios passaram a permitir a dedução ampla de materiais utilizados na obra, mesmo quando comprados de terceiros, desde que houvesse destaque de ICMS na nota fiscal.

Nessa linha de raciocínio:

Materiais como cimento, areia, brita, esquadrias, lajes, etc., comprados de terceiros, podiam ser deduzidos da base do ISSQN;

A lógica era evitar bitributação, uma vez que esses materiais já haviam sido tributados pelo ICMS;

Diversas legislações municipais e atos normativos (portarias, decretos) passaram a regulamentar esse tipo de dedução, ampliando o alcance da exclusão da base de cálculo.

O que mudou? (Novo entendimento)

Com a consolidação da jurisprudência pelo STJ, especialmente no julgamento do AgInt no AREsp 2.486.358/SP (2024), e com respaldo da Nota Técnica CTAT nº 02/2025,

a orientação passou a ser a seguinte:

Somente os materiais produzidos pelo próprio prestador do serviço, fornecidos fora do local da obra e com incidência de ICMS, podem ser deduzidos da base de cálculo do ISSQN;

* Materiais comprados de terceiros não são dedutíveis, ainda que haja destaque de ICMS na nota fiscal;

* A base de cálculo do ISS é o preço integral do serviço contratado, conforme o art. 7º da LC 116/2003.

Fundamento jurídico atual

A interpretação foi consolidada com base nos seguintes dispositivos e julgados:

Decreto-Lei nº 406/1968, art. 9º, §2º, “a” – recepcionado pela CF/88;

LC 116/2003, art. 7º – base de cálculo do ISS é o preço do serviço;

Tema 247 do STF (RE 603.497/MG) – o STF reconhece a recepção do DL 406/68, mas delega ao STJ a definição do alcance da expressão “materiais fornecidos pelo prestador”;

Decisões do STJ, como o AgInt no AREsp 2.486.358/SP – vedam a dedução de materiais adquiridos de terceiros mesmo com ICMS.

Efeitos para os municípios

Com a nova orientação, os municípios devem:

  • Revisar suas legislações locais, revogando ou ajustando dispositivos que permitam dedução ampla de materiais;
  • Reforçar a fiscalização e os critérios de retenção, impedindo deduções indevidas nas contratações públicas e privadas;
  • Evitar a renúncia de receita, sob pena de afronta ao art. 11 da Lei de Responsabilidade Fiscal (LC 101/2000);
  • Considerar que a arrecadação do ISS entre 2019 e 2026 será um dos critérios de distribuição do futuro Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) , conforme previsto na Emenda Constitucional nº 132/2023

Conclusão

A mudança na interpretação do STJ corrige um equívoco que vinha permitindo a erosão da base de cálculo do ISS nos municípios. Agora, com a jurisprudência pacificada e a orientação técnica da CNM, é possível atuar com segurança jurídica, garantir o aumento da arrecadação e proteger as finanças públicas. O momento é de alinhamento, revisão interna e adequação normativa para que os contratos de obras públicas e as fiscalizações estejam em conformidade com a nova norma interpretativa.

Referências

CNM. Nota Técnica CTAT nº 02/2025. Março de 2025.

STJ. AgInt no AREsp 2.486.358/SP, maio de 2024.

STF. Tema 247 – RE 603.497/MG.

LC 116/2003.

DL 406/1968.

EC 132/2023.

LC 101/2000 (LRF).

FAVARETO, Tiago Lima da Silva. ICMS e a dedução da base de cálculo do ISSQN: quando é possível?. Portal Contábeis, 2023. Disponível em: https://www.contabeis.com.br/artigos/69643/deducao-de-materiais-na-base-de-calculo-do-issqn-entenda-as-regras. Acesso em: abril/2025.

Por: Tiago Lima da Silva Favareto, assessor e Analista contábil do setor público, com ampla experiência na gestão de receitas municipais, controle de despesas e conformidade legal de tributos locais. É graduado em Ciências Contábeis pela UNIP, com formação complementar em Matemática pela FIU, e possui pós-graduação em Contabilidade Pública, além de um MBA em Contabilidade Tributária e Gestão Fiscal.

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